Depois de algum tempo, apenas me (tele)informando, estive pela manhã, no dia 16.1.2008, com o Xavier, no hospital da Ordem Terceira, na Tijuca, Rio de Janeiro.
Na véspera, tinha vindo transferido de outro hospital, para onde fora, depois de ter voltado para casa após a cirurgia a que se submeteu para introduzir um cateter, cujo objetivo é lhe dar mais qualidade de vida. (A história que antecedeu a introdução do cateter é uma prova de como a graça de Deus é, mas eu preciso deixar que o próprio Xavier a conte.)
Ele estava assentado, aspirado por uma sonda nasogástrica, cuja introdução é muito, muito dolorosa. (E a sonda saiu quando eu estava com ele). Apenas me piscou e depois, com algum mal-estar, conversou. Quis ir embora, que a visita precisa ser curta, mas não fui. Ele tinha o que me dizer e eu tinha o que ouvir.
A conversa ficou gravada, não como aquela no hospital, no dia 15 de setembro do ano passado. É que naquele dia, como era sua despedida de nós (como todos achávamos), pedi licença e gravei (áudio e vídeo) alguns momentos, que tiveram depoimentos, cânticos e orações. Quatro meses depois re(ou)vi as cenas do hospital. As de agora ficaram gravadas só na memória.
Xavier está mais magro. Ele não come. Já esteve mais amarelo, mas sua cor está quase como a de antes. Quando cheguei, a voz estava fraca, mas foi se alçando até ficar cristalina, embora sem força. Força tem essa garanta de ouro quando seu usuário decide pregar e é o que tem feito, com a voz se levantando e os joelhos (dos outros) se quebrantando. Nesse tempo todo vem pregando, em sua igreja e em outras, não para atrair a piedade (se está cansado, não vai), mas porque tem muito o que dizer e quer muito dizer. (Acidália Tymchak me disse hoje que espera que tudo esteja sendo gravado, para que a riqueza da experiência não se perca. Também espero. Guardo alguns minutos comigo). Tem compromissos, aos quais irá se tiver vida e força.
Quando se lembra, ali comigo, que estas são as primeiras férias que não pode passear e brincar com os filhos, as lágrimas lhe lembram sua condição. Quando falo de Clenir, que está no corredor para que eu possa estar ali fora do horário de visitas, lágrimas e sorrisos se incambiam, tamanha é a ternura diante de tamanha força com afeto.
É tudo manifestação da graça de Deus, que pode curar o Xavier, o que todos queremos. Ele nunca deixou de pedir por sua cura e nunca deixou de crer na soberania de Deus, que não é uma caixa fechada, como crêem alguns, mas trilhos, que percorremos juntos. E, então, não sei quem fala agora (lá, foi ele), o ex-aluno ou o ex-professor, porque nossos pensamentos se encontram: meu colega nadando na profundidade, eu na superfície; meu amigo conduzindo o tema e eu assentindo com os olhos, para não perder nem sequer o silêncio; meu mentor derramando seu coração sobre o meu, minhas mãos sobre os seus pés.
Nós não temos tempo para os amigos. Convidamos um ao outro para pregar em nossa igreja, mas sequer ligamos para agradecer ou dizer que foi muito bom. E nos justificamos dizendo que nossas agendas estão cheias, mas quem as preenche? (Digo eu: há uns dois anos um pastor-amigo me convidou para jantarmos, as famílias, na casa dele; ainda não respondi, por falta de tempo; há vários meses, um casal da igreja me convidou para jantarmos, as famílias, na casa dele, mas ainda não encontrei uma noite. E só fui ver o Xavier no meio da manhã porque o desejo foi, ainda bem, mais forte. Os compromissos esperassem.)
Nós não sabemos o que é depender de Deus. No fundo confiamos mesmo em nossos músculos. Quando temos um inimigo, em lugar de orar, procuramos um advogado e usamos as mesmas armas do inimigo, que é mais astuto e mais desonesto e ganha da gente. Só podemos vencer pela oração, mas nós preferimos usar a razão. (À noite, li na igreja o salmo 5.3: "De manhã ouves, Senhor, o meu clamor; de manhã te apresento a minha oração e fico esperando". Podemos até orar, mas o verbo "esperar", que é o centro da dependência diante de Deus, este não conjugamos.)
Nós vivemos num dos extremos. Como não queremos o pólo da oração positiva, própria da ideologia da prosperidade, também não oramos crendo que a oração do justo pode muito em seus efeitos. Quando está alguém enfermos, chamamos os líderes da igreja para orar? O povo crê mais na oração que seus pastores. Quando uma igreja tem um problema, o que deve fazer? Orar. E nós oramos? Até oramos, mas primeiros reunimos os engenheiros ou os advogados. E pomos Deus dentro do poder dos profissionais, não os profissionais dentro do poder de Deus. Então, não ficamos sabendo quem é Deus. Não entramos com ousadia diante do trono da Sua graça. E, conseqüentemente, não recebemos.
Nós vivemos vidas ralas.
Eu, saudável, fui visitar um enfermo. Como o poder se aperfeiçoa na fraqueza, saí fortalecido, desafiado a orar mais a Deus e a depender mais de Deus.
Obrigado, Xavier.
quinta-feira, janeiro 17, 2008
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